Morre Giussani, o homem da obediência

Lidia Menapace

Eu lecionava na Universidade Católica de Milão na época em que [...] aparecia, com alguns empurrões e caretas, e sem angariar simpatias, uma nova sigla que se chamava Gioventù Studentesca (GS). [...] Sendo que alguns membros de GS eram alunos de meu curso, fui logo informada sobre seu “don Gius”, que não era um assistente eclesiástico mas, ao mesmo tempo, era muito mais, um amigo cheio de autoridade, um cúmplice nas gargalhadas e no esporte, nas brincadeiras, enfim, uma figura de sacerdote muito popular, generoso, próximo, que entendia o presente e o vivia como sua aventura existencial de fé. Nos estudos, era uma grande vantagem ter os membros de GS como alunos. Eu dava cursos que, na época, continham algumas novidades pedagógicas e de pesquisa, no sentido de que havia exercícios preparados e discutidos em aula pelos alunos e pelas alunas e, conseqüentemente, as provas também eram em grupo, etc. Ter os alunos de GS ocupando a secretaria do curso significava poder dormir tranqüila. Eram de uma habilidade e precisão organizativa extremamente sólida, não falhavam nunca. [...] Estavam muito misturados com todos os outros e abertos às mais corajosas aventuras do pensamento e da pesquisa, e esse era o primeiro ensinamento de Giussani. Eu me lembro de que pediam aulas suplementares (eram um pouco exagerados, como o próprio padre Giussani, que, entre todas os textos das sagradas escrituras, creio que amasse muito a terrível sentença “ai dos mornos, eu os vomitarei da minha boca”. De fato, eles eram tudo, menos mornos). E nos cursos suplementares propunham que lêssemos Gramsci, os escritores do neo-realismo e realmente nada que fosse pio ou alinhado ou confortável. Giussani estimulava o risco. A prudência é uma virtude que Cristo exerceu em grau máximo até o dia em que foi parar na cruz, desafiando os poderosos: essa era a forma como falava das virtudes. Enfim, era um leitor fascinante do presente, sem rede de segurança, como se diria hoje. [...] Ou seja, Giussani foi um importantíssimo homem de fé, com uma influência talvez até superior à que acreditava ter (era freqüente nele a menção às coisas imprevistas, àquilo que não esperamos), com uma fé intrépida e capaz de pôr-se à prova - até certo ponto. Creio que seja isso que reste dele, e não seria mal lembrá-lo, indo além das imagenzinhas edificantes que lhe provocariam um pouco de asco. O ponto com o qual se identificava era a obediência à Igreja: a grande diferença entre ele e padre Milani ou padre Balducci era que, para ele, a obediência era uma virtude.

(Lidia Menapace, Liberazione, 23 de fevereiro de 2005)