O tempo da liberdade
Férias«A espera pelas férias documenta uma vontade de viver: justamente por isso não devem ser apenas “férias”. Então, ou será uma interrupção ou uma continuação do levar a vida a sério» (Milão, 5 de junho de 1964). Notas de um diálogo de junho de 1997, tomando um aperitivo com Dom Giussani, antes de partir para as férias
Desde os primeiríssimos dias do Movimento tivemos um conceito claro e simples: tempo livre é o tempo em que a pessoa não é obrigada a fazer nada, não há coisa alguma que se seja obrigado a fazer, o tempo livre é tempo livre.
Como nós discutíamos com freqüência com os pais e com os professores, que diziam que GS ocupava demais o tempo livre dos jovens, enquanto os jovens deveriam estudar ou trabalhar na cozinha, em casa, eu dizia: “O tempo livre é muito bom para os jovens!”. “Mas um jovem, uma pessoa adulta”, retrucavam, “é julgado pelo trabalho, pela seriedade do trabalho, pela tenacidade e pela fidelidade ao trabalho”. “Não”, eu respondia, “de jeito nenhum! Um jovem é julgado pela maneira como usa o tempo livre”. Oh, todos se escandalizavam. Mas... se é tempo livre, significa que a pessoa é livre para fazer o que quiser. Portanto, se entende o que a pessoa quer pela maneira como utiliza o seu tempo livre.
Eu entendo o que uma pessoa - jovem ou adulta - realmente quer não pelo trabalho, pelo estudo, ou seja, por aquilo que é obrigada a fazer, pelas conveniências ou pelas necessidades sociais, mas pela maneira como usa o seu tempo livre. Se um jovem ou uma pessoa madura desperdiça o tempo livre, não ama a vida: é bobo. As férias, com efeito, são o tempo clássico em que quase todos se tornam bobos. Ao contrário, as férias são o tempo mais nobre do ano, pois são o momento em que a pessoa se empenha como quiser com o valor que reconhece prevalecer na sua vida, ou então não se empenha de jeito nenhum com nada e então, justamente, é boba.
A resposta que dávamos aos pais e professores há mais de quarenta anos tem uma profundidade à qual eles nunca tinham chegado: o valor maior do homem, a virtude, a coragem, a energia do homem, aquilo pelo qual vale a pena viver, está na gratuidade, na capacidade da gratuidade. E a gratuidade está justamente no tempo livre que vem à tona e se afirma de forma surpreendente.
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A maneira de rezar, a fidelidade à oração, a verdade dos relacionamentos, a dedicação de si, o gosto pelas coisas, a modéstia na forma de usar a realidade, a comoção e a compaixão para com as coisas, tudo isto se vê muito mais nas férias do que durante o ano. De férias, a pessoa é livre e, se é livre, faz o que quer.
Isto quer dizer que as férias são uma coisa importante. Em primeiro lugar, isto implica atenção na escolha da companhia e do lugar, mas sobretudo tem a ver com a maneira como se vive: se as férias não fazem nunca você recordar o que gostaria de recordar mais, se não o tornam melhor para com os outros, mas o tornam mais instintivo, se não o fazem aprender a olhar a natureza com intenção profunda, se não o fazem fazer um sacrifício com alegria, o tempo do repouso não cumpre o seu objetivo.
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As férias devem ser as mais livres possíveis. O critério das férias é respirar, se possível a plenos pulmões.
Deste ponto de vista, fixar a priori como princípio que um grupo tenha de passar as férias juntos é antes de mais nada contrário ao que foi dito, pois os mais frágeis da companhia, por exemplo, podem não ousar dizer não. Em segundo lugar, é contra o princípio missionário: ir em férias juntos tem de responder a este critério. Seja como for, em primeiro lugar a liberdade acima de tudo. Liberdade de fazer o que se quer... segundo o ideal!
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O que você ganha, vivendo assim? A gratuidade, a pureza do relacionamento humano.
Em tudo isto, a última coisa de que podemos ser acusados é de convidar a uma vida triste ou obrigar a uma vida pesada: seria o sinal de que justamente quem faz as objeções é que é triste, pesado ou macilento. Onde macilento indica uma pessoa que não come e não bebe, por isso não goza da vida. E dizer que Jesus identificou o instrumento, o nexo supremo entre o homem que caminha na terra e o Deus vivo, o Infinito, o Mistério infinito, com o comer e com o beber: a eucaristia é comer e beber - ainda que hoje tão freqüentemente seja reduzida a um esquematismo do qual não se compreende mais o significado -. É um comer e um beber: o ágape é um comer e beber. A expressão maior do relacionamento entre mim e esta presença que é Deus feito homem em ti, ó Cristo, é comer e beber contigo. Onde tu te identificas com o que comes e bebes, de modo tal que “mesmo vivendo na carne eu vivo na fé do Filho de Deus” (“fé” quer dizer reconhecer uma Presença).