A força da fé
Não era um cardeal, nem um bispo importante. Era apenas um padre, como testemunhava a humilde sobrepeliz branca - a veste litúrgica - estendida sobre o caixão. No entanto, nunca, que eu me lembre, um padre, um bispo importante ou mesmo um cardeal conseguiu reunir em seu funeral todos os altos postos do Estado e dezenas de milhares de pessoas. Uma participação tão maciça e compenetrada era digna das exéquias de um pontífice. Assisti às exéquias de padre Giussani ao lado de quinhentos sacerdotes vindos de todos os lugares onde representavam Comunhão e Libertação. Quando entoaram o canto de entrada que o defunto amava (“Povera voce di un uomo che non c’è”: “Pobre voz de um homem que não existe”), deu para entender que estávamos assistindo a algo absolutamente inédito. Os leigos perto de mim começaram a responder (“Non è la povera voce di un uomo che non c’è: la nostra voce canta con un perché”: “Não é a pobre voz de um homem que não existe: a nossa voz canta com um porquê”). Ampliando o olhar do transepto para a catedral inteira, para as milhares de pessoas que estavam sentadas ou de pé às costas de Berlusconi e dos presidentes das Câmaras e dos ministros e dos deputados e dos governadores e dos prefeitos, vi que quase todos respondiam. Pois aquela gente era a gente de Comunhão e Libertação, o movimento constituído há quarenta anos por padre Giussani e repetidamente abençoado por João Paulo II, no qual leigos e sacerdotes percorrem o mesmo caminho, com hábito e funções diferentes, mas com um objetivo idêntico: “La nostra voce deve cantare perché la vita c’è, tutta la vita chiede l’eternità... La nostra voce canta con un perché” (“A nossa voz deve cantar porque a vida existe, toda a vida pede a eternidade... A nossa voz canta com um porquê”). [...] É extraordinário o destino de padre Giussani. Ele mesmo ficaria maravilhado com o enorme espaço dedicado a sua morte pelos mesmos jornais que quase o ignoravam, quando não combatiam, quando era vivo. Com Comunhão e Libertação, ele brandiu a cruz fazendo da fé também uma milícia social e civil na escola, no trabalho, nos jornais, na política. Foi esse aspecto de combatente do amor que conquistou o papa polonês e reservou a padre Giussani formidáveis desconfianças, não apenas no campo laico. [...] Quem - católico ou leigo - saiu ao anoitecer do Domo de Milão teve a impressão de que aquele caixão já pode ter dado novos frutos.
(Bruno Vespa, Jornal Il Mattino, 25 de fevereiro de 2005)