Agnes e o pai “Filho Pródigo”

Aos dezesseis anos, apenas esperava “morrer já”. Mas um abraço mudou a sua vida. E a da sua família. A história de Agnes, estudante em Uganda
Paolo Perego

“Odeio a vida. Espero morrer já. Qual o sentido de ter nascido?”. Pensamentos de uma menina, numa casa com paredes de barro e chapas de alumínio em Kireka, favela da periferia de Kampala, no Uganda. Os mesmos pensamentos que tinha naquela manhã de 26 de fevereiro de 2014, quando entrou pela primeira vez na Luigi Giussani School. Agnes conta a sua história, e dos seus dezassete anos completados em Agosto. “Cresci a ouvir dizer que o pai é a força da família. No entanto, durante anos, vivi o contrário disso”. O seu pai, diz Agnes, bebia. Muito. Ele tinha estudos e chegou a ser professor. Mas o álcool apareceu. “Quase sempre bêbado, dizia-me a mim, à minha irmã e aos meus quatro irmãos que não tínhamos futuro, e insultava-nos”.

Tudo estava às costas da mãe, uma das mulheres do Meeting Poin (uma Associação da região que acolhe as mulheres doentes de SIDA, fundada pela enfermeira Rose Busingye). “Em casa, fazíamos colares para vender”. Esta era a única renda da família e precisava de ser dividida entre as exigências e necessidades de todos. “Esta situação parecia ser demasiado dura, mesmo para minha mãe, e eu tinha medo de que mais cedo ou mais tarde ela se fosse embora. No entanto, ficou ali, perdoando, amando...”.

Neste entretanto, Agnes vai à escola, no meio de mil dificuldades: “A minha mãe pediu-me para estar com os que faziam Escola de Comunidade”. Era isso que a sustentava, e seria uma ajuda também para a sua filha. “Mas isso não me interessava, preferia ser livre para fazer o que quisesse”. Em casa, nada mudava; pelo contrário, tudo se tornava cada vez mais difícil. Quando a situação ficou pesada, os irmãos foram-se embora. “Menos Charles. À noite, normalmente, eu chorava, desesperada. Ele não. Ficava tranquilo, tinha uma certeza nos olhos...”. Charles também frequentava a Escola de Comunidade há algum tempo. “Eu queria aquela serenidade”.

Foi numa segunda-feira da segunda semana do segundo trimestre: “Entrei naquela sala. Tudo parecia estranho. As músicas, as coisas que liam, o que contavam”. Duas horas e meia. No entanto, Agnes percebe que todos estão felizes. “Para mim, o que diziam era teoria. ‘Deus ama-te, tu tens um valor’... Então porque é que eu tinha um pai assim? Porque é que eu me odiava?”.
Voltou para casa, mas aquelas perguntas não desapareceram. Agnes voltou à reunião seguinte. E à outra também: “Começava a sentir-me em casa. Um dia, estávamos a ler Porquê a Igreja? A minha mãe tinha-me dado uma cópia do livro”. O assunto era o homem que se distancia de Deus: “Era eu! Eu odiava-o, e queria vê-lo para lhe atirar à cara o meu coração”. Como podia perdoar o seu pai? “Rose disse-me: ‘O teu pai tem um valor. Foi Deus quem to deu. Para um ‘mais’. Talvez o teu pai seja exatamente o ponto de partida para tu descobrires isso’”. Agnes voltou para casa, mas desta vez com uma hipótese nova: “Eu olhava para ele e dava-me conta de que o amava”. Exatamente como ela mesma estava a descobrir que era amada. Será que tudo isto também podia ser para ele? Podia mudar a sua vida? “Comecei a ler-lhe os textos da Escola de Comunidade todos os dias, em casa. Os Exercícios da Fraternidade, Na Origem da Pretensão Cristã... E, depois, falávamos sobre o que tínhamos lido”.

Quatro dias, assim. E, na sexta-feira, Agnes volta da Escola. O pai tinha bebido. Mas já não era como antes. “Enfurecia-se comigo, dizia que eu estava a perder tempo com ele: como podia pensar que realmente ‘todas as circunstâncias são passos que nos conduzem ao Mistério’?”. Dizia estas palavras quando estava bêbado. Mas quando estava sóbrio entendia-as. Agnes não desistiu, nem mesmo diante da violência dos seus insultos.

Início de setembro. Já se passaram cinco meses desde o último copo de álcool. “Aos quarenta e oito anos, mudou. Parece feliz. A nossa família está feliz”. Ele decidiu encontrar-se com a Rose: “Ela acolheu-o como uma mãe, e eu nunca tinha visto meu pai sorrir daquele modo. Conversaram durante muito tempo enquanto eu os observava”. Depois do encontro, os dois voltaram para casa, e o pai não parava de falar: “Ouvis-te? Ela chamou-me filho pródigo. Eu sou o filho pródigo. E sei que este é o início de um novo capítulo da minha vida”. A vida não mudou: “As dificuldades continuam, inclusive a incerteza sobre o que comeremos amanhã. Mas estamos felizes. Eu estou”.