A Virgem Negra de Czestochowa

Czestochowa 2019. A mensagem de Julián Carrón

«Acolham a exigência de plenitude que vocês têm – que nós temos – no coração e levem-na até Nossa Senhora também por mim». Nas vésperas da peregrinação dos formandos de CL (3-14 de agosto), as palavras do presidente da Fraternidade
Julián Carrón

Caros amigos,

por que ir em peregrinação a Czestochowa? Só quem se dá conta da natureza do gesto é que pode ter razões adequadas para aderir.
Já é significativo que dure há tantos anos – não é óbvio mesmo –, quer dizer que a proposta encontrou e encontra até hoje uma necessidade, num momento de reviravolta decisivo para a vida: o fim do ensino médio ou da universidade.

É difícil que outros gestos possam charmar-nos a atenção para a nossa verdadeira necessidade mais do que uma longa peregrinação a pé, por causa do empenho e do cansaço que requer. Sempre lembro uma frase de Dom Giussani: «Um indivíduo que tenha vivido pouco o impacto com a realidade, porque, por exemplo, teve pouco com que se esforçar para realizar, terá um escasso sentido da própria consciência, perceberá menos a energia e a vibração da sua razão» (O senso religioso, Jundiaí: Paco Editorial, 2017, p. 155).

Pode aderir à proposta quem intuiu que ela pode ser adequada à própria necessidade. Mas essa intuição só pode ser verificada caminhando. A Igreja sempre viu a peregrinação como um paradigma da existência: a vida é uma estrada, um caminho. Os medievais falavam do homo viator, o homem em caminho. Então ir até Czestochowa serve para entender a natureza da vida, como lembrou o Papa em seu telefonema no início da Peregrinação Macerata-Loreto: «Peregrinar é caminhar. É fazer em uma noite o que se faz em uma vida: ir em frente». Na vida toda! Mas que quer dizer ir em frente? O Papa Francisco foi muito preciso: significa ir ao «encontro da plenitude. A plenitude de Jesus» (8 de junho de 2019).

Alguém poderia pensar: «Eu já tenho razões claras sobre o meu intento, tenho um caminho delineado, uma namorada, minha vida já está praticamente em ordem». Mas então para que ir? Para descobrir que nunca se está em ordem, porque a necessidade é tão profunda, que nenhuma imagem feita por nós é suficiente para satisfazê-la completamente. Como sabemos, a necessidade do coração nunca é extinta pelas nossas tentativas solitárias.

A peregrinação lembra a vocês que não estão sozinhos, que não estão abandonados a si mesmos com suas tentativas, pois há alguém que lhes diz: «Vamos, vamos juntos descobrir como é que se faz para viver». Se derem crédito ao clarão de consciência que há em vocês, permitirão que Cristo e Nossa Senhora respondam ao seu desejo de vida e de futuro.

Vão descobrir, assim, que só Cristo pode responder à necessidade ilimitada do coração. Como sempre disse Dom Giussani: «Com efeito, Cristo se propõe como resposta àquilo que “eu” sou», ou seja, à nossa necessidade humana, «e apenas uma tomada de consciência atenta, mas também terna e apaixonada, de mim mesmo pode fazer com que eu me escancare e me disponha a reconhecer, admirar, agradecer, e vivenciar Cristo. Sem essa consciência, até mesmo o nome de Jesus Cristo não passa de um simples nome» (Na origem da pretensão cristã, São Paulo: Cia. Ilimitada, 2012, p. 11).

Portanto, olhem com seriedade para a necessidade de vocês, e isso os encherá de razões para ir. A peregrinação será para cada um de vocês um grande gesto de pedido: poder viver à altura da plenitude que todos desejamos e que Cristo trouxe ao mundo. Para partir, vocês não precisam já estar em ordem, não precisa que estejam prontos. Vocês vão ao encontro da plenitude justamente porque não se sentem em ordem.

Recentemente deparei com uma carta pública a Bernard-Henry Lèvy, escrita pelo romancista francês Michel Houellebecq: «Para mim é penoso admitir que cada vez mais senti o desejo de ser amado. Um mínimo de reflexão convencia-me naturalmente, toda vez, do disparate de tal sonho [...]. Mas a reflexão não podia fazer nada, o desejo persistia e tenho que confessar que persiste até hoje». O autor é o emblema do niilismo, de modo que tudo pareceria acabar no nada; seu pensamento lhe diz que é um absurdo o mero pensar nisso, «mas a reflexão não podia fazer nada», porque «o desejo persistia e tenho que confessar que persiste até hoje» (F. Sinisi, “La vita è rara”, Tracce, n. 6/2019, p. 65). O tempo evidencia que o desejo de plenitude que nos constitui persiste até mesmo num homem que acha que tudo acaba no nada. O tempo torna mais evidente a irredutibilidade das nossas exigências.

Cada um tem de decidir se dá crédito aos próprios pensamentos ou ao que permanece, apesar de todos os nossos limites e das nossas fragilidades: uma irredutível exigência de vida. No meio do colapso de tudo, há algo que não colapsa. Vocês vão a Czestochowa para seguir esse “irredutível” que há em vocês.

Reflitamos um pouco sobre a nossa experiência: às vezes nos surpreendemos com que determinados dinamismos, que não nos pertenciam, começam a tornar-se nossos, ficamos impressionados ao ver certos frutos na nossa vida. São dinamismos e frutos que não nos foram dados por nós mesmos, pois amadureceram em nós ao participarmos de um lugar, da comunidade cristã, dentro da vida da Igreja.

Caminhando até a Virgem Negra, lembrem que, para nos ajudarmos a entender aquilo a que o Mistério nos chama – quais frutos quer gerar em nós –, Ele não nos deixa sem sinais. Às vezes é muito discreto nas sugestões, e depende muito da nossa disponibilidade seguir os sinais que Ele põe na nossa frente. Por isso, prestem atenção para deixar-se surpreender com o que virem, com os encontros que fizerem.

Agradeço-lhes o testemunho que me dão com sua decisão de concluir os estudos médios e universitários com uma peregrinação tão desafiadora.
Acolham a exigência de plenitude que vocês têm – que nós temos – no coração e levem-na até Nossa Senhora também por mim. Obrigado.

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