A música, a beleza e os olhos de David
David Horowitz, músico e compositor nova-iorquino, e parte da história de CL nos EUA, morreu recentemente. Da apresentação d’O senso religioso de Dom Giussani na ONU à amizade com Claudio Chieffo. A lembrança de um amigoQue o Seu grande Nome seja exaltado e santificado no mundo que Ele criou conforme Sua vontade. Que Ele estabeleça Seu reinado durante nossas vidas e nossos dias e durante a vida de toda a Casa de Israel, rapidamente e em breve; e dizei Amém.
Que Seu grande nome seja abençoado para sempre e por toda a eternidade.
Abençoado, louvado, glorificado, exaltado, enaltecido, adorado e elevado seja o nome do Todo-Poderoso, bendito seja Ele. Acima de todas as bênçãos e hinos, louvores e consolações que já foram ditos no mundo; e dizei Amém.
Que haja paz abundante do céu, e vida para nós e para todo Israel; e dizei Amém.
Com esta oração judaica tradicional, eu me despeço de meu amigo e mentor. A última vez que vi David foi no funeral do meu pai, que faleceu em janeiro passado. David tocou o Kadish que ele tinha composto para piano e violino por ocasião da morte de seu pai. Comovida pela sincera beleza emotiva da música de David, minha família ficou muito agradecida.
David tinha como profissão compor música para campanhas publicitárias. Era algo irônico, porque David sempre dizia que sua música carregava tristeza e melancolia, que não são exatamente as melhores emoções para vender produtos. No entanto, este senso agudo do coração humano que David tinha, que o fazia ansiar pela beleza através da melodia e da infinita harmonia de suas composições, era perfeito para transmitir a exata emoção para todas as circunstâncias em que nós, simples seres humanos, possamos nos encontrar, de comprar carros a escovar os dentes, de viajar para lugares exóticos a fazer negócios, de beber uma cerveja ou um refrigerante a... Nada era tão banal e trivial a ponto de David não conseguir escrever algo comovente a respeito, aplicando nisso toda a sua humanidade e genialidade.
David ouvia, ouvia e tornava a ouvir música. Parecia-me que conhecia todas as peças musicais, clássica, jazz, pop, folk... Em sua casa em Connecticut, tinha uma sala de audição, um santuário interno onde se sentava para ouvir música por horas e horas.
Passei muitas horas com ele, como discípulo e aprendiz. Um dia típico consistia em três sessões de gravação de música de todo tipo com os melhores músicos de Nova York. Então, comíamos todos juntos com os músicos presentes, e, à noite, eu ia jantar em sua casa com ele, sua esposa Jan e seus filhos pequenos Mara e Jesse, e depois ouvíamos mais música!
David ficava feliz compartilhando sua vida e sua paixão com o maior número possível de amigos. Ele derramava seu espírito generoso e seu coração em tudo o que amava. A certa altura, eu estava tão entusiasmado ao conhecer meus novos amigos de CL em Nova York, os quais pareciam compartilhar esse mesmo amor pela beleza, que os apresentei a David. Ele imediatamente se vinculou a eles e começou a ler os livros de Dom Giussani como se o conhecesse desde sempre. Houve muitos concertos no Meeting de Rímini, muitos jantares incríveis juntos com vinho fluindo, tantas risadas e tanto carinho.
Uma vez, ele e Jan emprestaram sua linda casa de campo em Connecticut para um fim de semana de estudo de nosso pequeno grupo de universitários (CLU). Que outra pessoa com tamanho sucesso no âmbito cultural poderia ser tão generosa com um grupo de jovens que mal conhecia? Mas ele chegou a conhecer todos eles e se tornou uma parte muito importante de muitas de nossas vidas.
Ele abriu o estúdio DHMA à “Bay Ridge Band”, para que ela pudesse gravar com um altíssimo nível de produção. A partir de sua profunda amizade com Claudio Chieffo, produziu um belo álbum, Come la rosa. Quando Claudio faleceu, David e Jan choraram com todos amigos dele.
À sua maneira, discreta e profunda, foi amigo e mentor de muitos de nós e da comunidade musical daqui de Nova York. Foi impressionante ver a quantidade imensa de mensagens de conforto para Jan, Mara e Jesse.
Lembro-me de David como uma pessoa paciente, mas às vezes não tanto, quando tentava me corrigir como compositor. Ele pensava que eu nunca me comprometia a fundo com as minhas ideias e que eu escutava muito pouco a voz interior da criatividade. Eu era o oposto de David, tão instintivo e reativo, mas ele me empregou por mais de vinte e cinco anos, e também me manteve mesmo, quando eu não estava trabalhando bem. Ele poderia ter me despedido, e talvez tenha estado próximo a isso, mas no final sempre confiou em mim e soube me motivar para não deixar de indagar e melhorar. Ele nem precisava falar. Bastava sua presença. Provavelmente, no final respondi bem, porque ele motivou a parte mais profunda de mim mesmo, a que amava a excelência e as mais altas aspirações de nosso ofício.
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David falou sobre O senso religioso em sua intervenção na ONU em 1997, quando o livro foi apresentado; ele citou: «Quanto maior é a arte (pensemos na música!), mais ela abre, não confina mas escancara o desejo, é sinal de alguma outra coisa». David acrescentou: «Essa “outra coisa” é exatamente o que quero expressar, reconhecer e buscar em todos os aspectos da minha vida... É o caminho da descoberta». Eu reconheci isto em David na primeira vez em que o olhei nos olhos, uns olhos que me olhavam, mas ao mesmo tempo olhavam também para um horizonte distante e belo.
«Que haja paz abundante do céu, e vida para toda a eternidade», também para o meu querido amigo e mentor, ao encontrar a Beleza que ele buscava em toda nota e acorde que escrevia.