Uma alvorada nova
Uma manhã cheia de esperança, um caminho a percorrer: a pintura de Friedrich é o Cartaz de Páscoa de CL. Luca Doninelli escreveu sobre ele na Tracce de abrilManhã de Páscoa, pintada por Caspar David Friedrich na década de 1830, é uma pintura muito complexa e dramática, cheia de sinais, alarmes e reflexões que deixam sua marca em uma tela aparentemente simples e organizada.
A composição é solene. É uma manhã fria de Páscoa. No centro, vemos uma estrada: é típico da arte de Friedrich introduzir elementos que remetem ao movimento. Friedrich é um pintor muito narrativo, literário, e os instantes de tempo que sua mão captura sempre pressupõem um “antes” e um “depois”. O tempo deixa sua marca também nas árvores, que à direita e à esquerda enquadram a cena, dividindo-a ao mesmo tempo em duas partes: do lado de cá das árvores está a estrada – no final da qual três mulheres param: as duas nas pontas vestem um vestido longo com um grande xale vermelho, e usam chapéus que indicam um certo nível social. A mulher entre elas, pelo contrário, está completamente coberta de preto e sugere a ideia de uma perda, de um luto.
Além disso, a parte da cena que está além das árvores e além do final da estrada é constituída por um cemitério, com algumas lápides à vista e outras figuras humanas. É, no entanto, um cemitério estranho, sem muro, sem portão, da mesma natureza dos campos cultivados que o acompanham: como se também o lugar onde os mortos descansam fosse um terreno de semeadura, onde algo está destinado a crescer.
As mesmas árvores que enquadram a cena não estão totalmente nuas. Estamos no início da primavera, as folhas estão começando a renascer, e as sementes caídas deram vida, aos pés dos troncos maiores, a uma floresta de brotos, de novas pequenas plantas.
Observando o quadro ainda mais de perto (procure-a na internet, vale a pena), percebemos que a mesma estrada que conduz ao cemitério é percorrida, subterraneamente, pelas trilhas nervosas das raízes das árvores, vivas e vitais. Ainda faz frio, em suma: mas a vida está lá, nada pode matá-la.
Mas não é tudo. A luz que permeia a pintura é uma luz ainda invernal, crepuscular. Poderia ser a alvorada de Páscoa. No entanto, o sol já está alto, e julgando pelo período do ano, poderíamos dizer que está caminhando em direção ao meio-dia. Aproximando os olhos da pintura, é possível ver, mais abaixo, uma trilha, depois apagada pelo artista, onde provavelmente o sol tinha sido inicialmente colocado, numa posição que pareceria mais coerente com a luz ainda fraca. Mas Friedrich, depois, quis mover o sol para cima.
Portanto, os visitantes do cemitério, começando pelas mulheres em primeiro plano, não estão aqui apenas para chorar por uma pessoa morta: uma esperança, um pressentimento os move em tristes passos, um estranho coração acelerado se mistura com o luto. Foi o que aconteceu certa manhã, dois mil anos atrás, quando três mulheres foram ao sepulcro e um estranho homem em roupas brancas (lembremos que as roupas brancas eram destinadas aos loucos) disse palavras perturbadoras.
A própria natureza parece ter enlouquecido: o que é esse sol alto a esta hora?
Assim, o grande artista alemão nos ajuda a ler a Páscoa: não como um milagre separado, e sim como uma correspondência impossível, porque as mulheres que, naquela manhã, subiram até o sepulcro tinham a morte em seu coração, mas uma esperança indizível estava escondida dentro de sua tristeza. «Vamos ver», elas devem ter dito a si mesmas, talvez com lágrimas nos olhos, mas com aquela esperança inconfessável a colocar um pé na frente do outro.
E, enquanto isso, o sol já está alto: a essa hora. Esta – parece querer dizer-nos o artista – é a vida da fé, nossa vida, pobre e frágil, mas estranhamente certa, porque aquele homem que deveria estar no sepulcro nos disse e provou: não fomos feitos para a morte.
As palavras do Papa Francisco destacam o sentido do que o quadro nos conta: a fé não é feita de discursos, demonstrações, equações. A fé é um caminho, o caminho de todos, o caminho de nossa vida, e é ao longo desse caminho normal e cheio de obstáculos, tristezas e aborrecimentos que Deus se tornou nosso companheiro para «partilhar conosco esta estrada e oferecer-nos o seu olhar para nela vermos a luz». O Papa insiste na ideia da luz: Deus não nos oferece explicações, Sua resposta é «uma história de bem que se une a cada história de sofrimento para nela abrir uma brecha de luz» Não é uma luz que se adiciona à realidade (um cristão não é um visionário): é a luz da própria realidade, que uma profunda obstrução – o pecado original – nos impediria de ver sem a presença contínua, no tempo e no espaço, de uma Graça esperada e, ao mesmo tempo, imprevisível, como aquele sol já alto no crepúsculo da manhã.
Assim, a lei da vida muda: não é um caminho em direção à morte, mas uma «retomada presente e permanente», como sempre nos lembrou Dom Giussani. Não é a queda que define o homem, mas seu contínuo recomeço. Retomada, recomeço são as palavras pobres e cotidianas que melhor traduzem a grande palavra Ressurreição, que seria uma maravilhosa lenda se não se tornasse uma experiência humana possível a todo instante.
O homem adulto é aquele que baseia sua moralidade cotidiana nesse dom inimaginável. E assim, Dom Giussani nos lembra que «para cada dia e hora e instante da nossa vida, a ressurreição, a retomada, o reinício devem ditar o caminho, devem ser a lei».
A pintura de Friedrich é a ilustração sensível e existencial dessa experiência cotidiana e excepcional, cotidiana e heroica (como disse São João Paulo II). Ainda está frio, a dor ainda está viva, mas o frio e a dor já estão dentro de uma nova história.
Como tantos amigos nos testemunharam, até recentemente, amigos muitas vezes jovens, como a querida Silvia Simoncini, que deixando-nos – no sofrimento e, portanto, sem nenhuma retórica – nos indicaram com segurança este caminho da fé não como um sonho, mas como o único, verdadeiro e real caminho para todos os homens.