Pippo Molino (Foto: Luca Fiammenghi /Fraternidade CL)

A voz de uma história

Pippo Molino, músico e compositor, fala sobre o canto no Movimento em seu novo livro: «Nasce numa comunidade viva, é proporcional à experiência que fazemos. E um coro é caridade pura». Da Passos de jan/fev
Paola Ronconi

Uma coisa é certa: no movimento de CL se canta. Quando há Exercícios Espirituais, durante a liturgia, antes de um encontro. Mas também em passeios, ou numa noite entre amigos. Talvez seja uma das expressões mais características. “É uma sensibilidade, uma educação desde o início”, explica Pippo Molino, músico e compositor, que desde os anos oitenta é responsável pelo canto em CL, em particular pela música coral. Hoje ele é acompanhado por Carlo Carabelli, que, além da responsabilidade geral dos cantos, acompanha os universitários, enquanto ele continua a reger o coro dos adultos. Recentemente publicou Un’altra musica (Edições Volontè&Co, sem edição em português), um livro em que conta a história do canto em CL, suas principais dimensões e propõe exemplos de repertório com partituras e, através de QR codes, referências a áudios para ouvir. “Se em CL se canta bem, não é principalmente mérito de alguém. Mas é uma história iniciada com Dom Giussani e que continua viva”, explica. “‘Por que tanta música num livro?’, perguntaram-me. Tente ouvir!”. E ler o que, ao longo dos anos, o próprio Giussani disse sobre a música e o canto.

Por que as pessoas ficam tão impactadas pelos cantos do Movimento? Mesmo dentro da Igreja…
Elas ficam impactadas e ponto, às vezes até durante um passeio, ou seja, não necessariamente na igreja. Elas são impactadas porque hoje, em geral, ninguém mais canta junto. Uma vez, era 2004, Dom Giussani me disse: “Pippo, ninguém mais canta!”. Isso já era naquela época a sua preocupação, que não se cantava. Antigamente não era assim: por exemplo, cantava-se também trabalhando. Em ambientes eclesiásticos, muitos reconhecem que “como canta CL, ninguém canta”. Mas, repito, não por mérito de alguém.

Por que se tornou algo tão raro cantar e cantar bem?
Certamente o canto é proporcional à experiência que se faz. Você ouve cantar bem na igreja onde há uma comunidade cristã viva, ou onde há monges e monjas que acreditam. Onde há fé, há canto, uma humanidade verdadeira. E falamos de canto do povo, não tanto da genialidade individual. Depois, de um povo emerge o indivíduo, o solista. Nossos cantores-compositores mais famosos vieram de um povo. Primeiro Adriana Mascagni, que também regia o coro. Depois Claudio Chieffo, com canções importantes. E muitos outros.

Então foi uma consequência eles começarem a escrever cantos…
Claro! Uma vez alguém disse que o canto no Movimento nasceu com seus cantores-compositores. Dom Giussani ouviu estas palavras e corrigiu: “Na primeira missa de GS, a primeira de todas: foi ali que nasceu o canto do Movimento… O início do canto do Movimento é o início do Movimento. Não há diferença… Pertence-se e surge o canto”.

Como era trabalhar com Dom Giussani? O que ele pedia?
Quando eu era jovem, no Liceu Berchet, ou na Universidade Católica, eu sempre o vi de perto, cuidando da música. Em 86, quase aos quarenta, decidi assumir o coro. E, nesse meio tempo, nesses anos, tornou-se uma amizade cada vez mais livre: para ele, a liberdade era muito importante, tanto que ele nunca me pediu para assumir essa responsabilidade, decidi por mim mesmo, com muita lentidão em relação à minha história. Trabalhar com ele era, acima de tudo, uma grande liberdade. Ele dizia: “É caridade pura. O coro, o canto, é o serviço mais útil e gratuito para a comunidade. Se uma comunidade não tem coro, significa que não tem paixão”. Observações que, quando as releio, entendo que ainda não estou no ponto que ele apontava. É um chamado agora. E sempre me pergunto: “Como faço esse serviço?”

Como são escolhidos os cantos nos momentos fortes do Movimento?
A escolha dos cantos sempre foi de Dom Giussani, nós fazíamos propostas, e ele sempre disse que quem escolhe os cantos é quem dirige o Movimento. Foi assim com Pe. Julián Carrón e agora com Davide Prosperi: quem guia o gesto decide. Justamente porque o canto é um aspecto fundamental. Uma vez estávamos nos Exercícios do CLU. Canto novo para aprender, Estote fortes in bello. Eu ensaiei. Depois ouvi que Dom Giussani tinha chegado e perguntei o que ele achava. “Bonito, bonito. Se posso dizer: um pouco pegajoso”. Entendi que ainda havia trabalho a fazer e adiamos. Ele tinha esse ouvido. Não digo isso para rasgar ceda, mas ele foi educado desde jovem. Também no livro retomo aquele trecho em que Giussani conta que seu pai escolhia ir à Missa onde sabia que haveria um coro. Para o pequeno Luigi, a polifonia parecia uma confusão de vozes. Até que uma vez ouviu o Caligaverunt, um dos responsórios da Sexta-Feira Santa, de De Victoria: “E desde então”, diz ele, “me apaixonei por De Victoria e por toda a polifonia”. Era a vida, o que acontecia com ele que o fazia se apaixonar por isso ou aquilo. Todas as suas observações, se pensarmos bem, nunca estavam ao lado das coisas que vivia, mas dentro, então agora somos ajudados por essas palavras dele. Outro exemplo: Quinta-Feira Santa de 1994, Certosa di Pavia. Ensaio do coro, ele chega, nos olha e diz: “Façam este serviço com sentimento, significa pronunciar as palavras como suas. Mesmo que agora ainda não seja verdade, vocês o fazem acontecer novamente. Vocês se impõem à realidade opaca”. Não é um discurso espiritual, está dentro do canto. Entusiasmante!

“Nos Exercícios da Fraternidade, fazer um solo não na frente de, mas para dezesseis mil pessoas!… Vocês expressam esses dezesseis mil, a consciência deles, são a voz de um povo, de um destino”, disse em 1994. Como se aprende?
Aprende-se identificando-se com a experiência do Movimento: é verdade hoje como era verdade com ele. Graças a Deus, seguimos em frente com essa sensibilidade. As pessoas vêm para o nosso coro por causa da experiência que se faz. Não simplesmente para cantar. Carlo e eu sempre fazemos as audições. Para entrar no coro dos universitários, da última vez, 120 pessoas se candidataram. Então não é uma questão de “quando Giussani estava aqui”, mas agora! Ainda em 1994, ele disse: “Se posso dar um conselho: não fiquem preocupados demais com vocês mesmos, com a capacidade de se expressarem. O conteúdo da preocupação não pode ser a expressão de si mesmo, mas expressar a consciência desse povo. Por isso o coro, o canto, é o serviço mais útil e gratuito para a comunidade”. Há uma maneira de cantar que é diferente se for identificada, poderíamos dizer se for religiosa. O título do meu livro, longe de ser aristocrático, vem do modo de falar popular, em milanês, “l’è n’altra müsica”, isto, no canto do Movimento há algo além, que não é mérito nosso.

No livro você fala de “modalidade expressiva” e lista uma série de indicações práticas. Como nasceram?
Com a prática, gradualmente. Quando eu era menino no Berchet, rezávamos as Laudes mas sem o reto-tom. Aos poucos, com o tempo, com os Memores Domini, Giussani viu que o reto-tom, emprestado do canto gregoriano, ajudava e era mais ordenado. E a dificuldade em manter a nota ressalta a vigilância que se deve ter ao rezar. Quando se diz que é uma experiência, vê-se também nisto, no fato de que, com o tempo, muitas coisas foram compreendidas.

Então a reza das Horas é um canto?
Não há uma linha de demarcação clara entre o que é canto e o que não é. Por exemplo, os Salmos de Gelineau, de que Giussani gostava muito, musicam o salmo remetendo ao reto-tom, são muito silabados.

Outro capítulo: a variedade dos nossos cantos. O que une todos esses gêneros?
A variedade vem da vida e da gradualidade de uma história. Giussani começou com Vero amor è Gesù, com O cor soave (que é uma lauda filipina que ele aprendeu no seminário). Ou são cantos para cantar junto ou para ouvir. Começou com estes, depois pegou cantos de escoteiros, como La traccia ou o Inno alle scolte: a integridade do homem medieval que orava pela salvação da cidade e da sua alma. Seguia o que acontecia: uma vida.

Depois vieram os compositores…
Além de Mascagni e Chieffo, pessoas como Roscio, Valmaggi, até chegar a Riro Maniscalco ou a Pe. Anastasio (que não tive tempo de incluir no livro). E também o gregoriano. Todos os papas falaram sobre ele, dizendo que é o canto da Igreja. Mas hoje, quem canta o gregoriano? Ou o canto popular russo, como A sineta… A maioria das escolhas deriva das paixões de Giussani. E depois dos encontros: para o canto napolitano foi assim.

Em CL há momentos mais estruturados, mas também o cantar juntos nas férias tem sua importância…
Claro. É importante que a normalidade da vida tenha o canto. Um jeito especial de estar juntos. De se escutar. É uma educação. Ou você fica sabendo que em Taiwan, num mundo totalmente diferente do nosso, eles cantam nossos cantos. Ou os africanos, que há alguns anos cantaram cantos alpinos no Meeting de Rímini: cantaram bem. Dava para entender que a voz era diferente, mas estavam identificados. Uma maravilha!

Voltemos à pergunta anterior: o que une todos esses cantos?
O mérito está em não se desconectar do método de Dom Giussani. Quando procuramos canções, quando pedimos aos nossos cantores que façam propostas, é um trabalho enorme. Por exemplo, Lucio Dalla tem uma profundidade notável, mas é muito difícil de cantar junto, não é fácil conseguir.

Ouvimos um solista, um coro, e surge a vontade de cantar. A paixão é contagiosa?
Absolutamente. E educa. Quantas vezes Giussani nos disse que se entende muito mais pelo canto do que por muitos raciocínios. O canto nos nossos encontros tem a mesma importância da palavra de quem fala, e muitas vezes o conceito que se quer comunicar é compreendido primeiro.

Santo Agostinho, também citado no livro, dizia que “quem canta reza duas vezes”.
O canto bem feito gera o silêncio. Na Igreja é assim. Ele, Agostinho, vivia isso. E nós também vivemos essa graça.