“O universo não é suficiente”

Quarenta estudantes se reúnem em Lyons, nas montanhas do Colorado, para as férias dos Cavaleiros de Denver. E, pela primeira vez, dez deles vêm da Califórnia. A descoberta de uma amizade que elimina 1.500 quilômetros de distância
Paola Ronconi

“Cavaleiros do Graal” é um grupo de estudantes na faixa etária do 6º ao 9º ano, que tem como objetivo aprofundar juntos a experiência cristã em todos os aspectos da vida (estudo, esporte, lazer ...). O nome indica uma característica fundamental da vida cristã: a contínua busca por algo precioso, pelo tesouro da vida, simbolizado pelo Santo Graal, o cálice usado por Jesus na Última Ceia. Esta experiência nasceu em 1985, na Itália, pela iniciativa de alguns pais e professores ligados ao Movimento Comunhão e Libertação.

Na base está, portanto, uma proposta educativa clara, que visa a descoberta de que na companhia de Jesus toda a vida se torna mais bonita. A participação é totalmente livre (não é necessário inscrever-se em nenhuma associação) e é aberta também a quem não provém de uma tradição cristã.



Nestes anos os grupos dos Cavaleiros se espalharam por toda a Itália e chegaram também a outros países, como os Estados Unidos, que realizaram um encontro de férias para os seus Cavaleiros de 25 a 29 de julho passados. Eram 40 meninos, sendo que 30 participantes do Colorado e 10 que vieram pela primeira vez da Califórnia, do outro lado do País. O fio condutor dos cinco dias foram os versos de Eugenio Montale: “Sob o azul profundo do céu, algumas aves marinhas voam para longe; nunca param: porque todas as imagens trazem escrito: mais além”.
As coisas que eu vejo... (The things that I see... ) foi um dos refrãos mais cantados em Lyons. “Vocês foram convidados e disseram sim” diz aos Cavaleiros, padre Accursio Ciaccio (para todos, “padre Accu”), sacerdote da Fraternidade de missionários São Carlos Borromeu que mora em Broomfield (a 30 quilômetros de Denver) e é responsável pelos Cavaleiros: “Prometo que se continuarem dizendo ‘sim’ durante estes dias, verão coisas muito mais bonitas do que as montanhas ou o céu... Encontrarão algo muito maior...”.

Para os californianos, chegar até aqui não foi fácil, duas horas de avião e uma grande despesa. “Mas alguns jovens que não poderiam vir às férias pegaram esponja e sabão para lavar carros e ajudar seus amigos a arrecadar dinheiro”, conta Andrea Battistoni, pesquisador de Standford e um dos responsáveis do grupo de San Francisco. Uma arrecadação on-line também ajudou a cobrir boa parte dos custos. Muitas doações vieram da Itália, houve também doações anônimas, como a de “Batman”, “Rei Arthur”, “Barack Obama”, “Simon & Garfunkel”... Ou a de 1.000 dólares de um tal “XXXYYY”. That’s America!

Nas instalações do “Peacefull Valley Ranch” de Lyons, aqueles 1.500 quilômetros de distância entre as respectivas cidades são logo anulados: mesmo com alguns estratagemas, todos os dias se faz a chamada, e se o que vem depois de você não está presente, você deve dizer o seu nome e... onde ele está. Na hora da refeição, os californianos pegam uma mesa à parte, mas de repente alguém se mistura, “Eles realmente queriam nos conhecer, saber quem somos, por que estávamos ali”, diz Alan. “Nem com nossos colegas de escola conseguimos essa familiaridade em tão pouco tempo”, diz Nancy. Estamos muito longe do modo politicamente correto dos norte-americanos.
Pouco a pouco, entre passeios, orações e cantos se introduz uma maneira desconhecida de estar juntos, jogar e até de usar algumas artimanhas.... “Uma noite, estávamos jogando no bosque”, conta Andrea. “Mas fizemos muito barulho e a polícia chegou. Para que pudessem continuar a brincadeira, eles decidiram jogar em silêncio. Vocês já viram meninos de doze anos correndo um atrás do outro em silêncio?!”.
Todas as manhãs padre Accu propõe aos meninos esta pergunta: “O que você viu hoje?”. John conta: “Durante o passeio, quando chegamos ao topo de uma montanha, podíamos ver todo o Colorado. De repente, todos fizemos silêncio. Assim, percebemos um cervo nas proximidades, a beleza das montanhas apesar do cansaço do caminho, percebemos Algo que bate em nosso coração quando estamos para dormir”. “Quero viver este silêncio a vida inteira”, dirá no último dia, na Assembleia.



Numa das noites, Giacomo, astrofísico amigo de Battistoni, dá uma aula sobre as estrelas. Saem inclusive para olhá-las. “Se precisassem se fechar em uma sala, o que levariam com vocês?, pergunta padre Accu na manhã seguinte. Os meninos respondem, cada um com o que tem na cabeça. Mas percebem que nada seria suficiente. Luke, do segundo ano, diz: “Nem mesmo o universo ou as estrelas que vimos ontem à noite”.

Os dias passam rapidamente, as férias terminam e sentem certa nostalgia, por causa “de algo extraordinário que experimentaram nesta semana”, diz padre Accu: “Chama-se Jesus. Ele está sempre com vocês. Se o percebem, digam também aos outros, se não O reconhecem, mendiguem por isso”. Esta é a regra dos Cavaleiros.
A pergunta continua, mesmo já tendo voltado para casa: o que você viu hoje? “A beleza, a mesma que vi quando fui a Roma ver o Papa Francisco com os Cavaleiros da Itália”, diz Aline. Acho que Jesus quis me mostrar uma coisa muito bonita e agora está me dizendo: “Se foi possível lá, é possível também aqui, na Califórnia, onde você está agora!’”.
Mark: “Como a raposa diz ao Pequeno Príncipe: ‘agora, o trigo, que é dourado como teus cabelos, fará lembrar-me de ti. E amarei o barulho do vento no trigo...’, porque quando você é cativado, tudo lhe faz lembrar daquilo que o cativou. Torna-se um passo familiar, o qual não precisa temer. E tudo agora fala daqueles amigos que encontrou no Colorado”.