Quando ciência e fé caminham juntas
Foi aberta a causa pela beatificação de Jérôme Lejeune. Nos anos cinquenta, ele descobriu a origem genética da síndrome de Down. Um homem que, como escreveu João Paulo II, “sempre soube usar o seu conhecimento da vida pelo bem do homem”Paris, quarta-feira, 11 de abril de 2012. Um dia como outro qualquer. À espera das próximas férias que aqui acontece na primavera e próximo das eleições. Suspensos no vazio, entre uma campanha eleitoral estéril de ideais e de sentido, recheada de promessas. A célebre frase de Malraux - “não há ideal pelo qual possamos sacrificar-nos já que todos nós conhecemos as nossas mentiras, nós que nem ao menos sabemos o que é a verdade” - parece ressoar e destacar profética e cinicamente sua verdade. Então, o que pode pedir um homem são em nossos dias? Existe ainda um lugar onde se possa olhar e procurar a verdade, onde se possa de novo esperar dias felizes? A Igreja. Uma realidade humana que propõe uma vida e nos surpreende.
Estamos na oitava de Páscoa. A Igreja celebra a vitória de Cristo sobre a morte e diz a todos nós, de novo, ”olha-me” e olha a vida desse homem. Um cientista, um médico mas, acima de tudo, um homem de grande fé: Jérôme Lejeune. Em menos de cinco anos se formalizou o pedido diocesano de beatificação do professor Lejeune e monsenhor Éric de Moulin-Beaufort, bispo auxiliar de Paris, a concluiu solenemente celebrando uma missa. Agora as atas foram passadas para Roma onde será aberto o processo. Mas, quem é Jérôme Lejeune?
Assim que soube do encerramento do inquérito diocesano, avisei alguns jovens amigos, também médicos. Poucos reagiram porque não o conheciam, mesmo sendo Lejeune um dos maiores cientistas do século XX. João Paulo II escreveu, quando da sua morte, ocorrida em 3 de abril de 1994, dia de Páscoa, “querer hoje agradecer o Criador (...) pelo particular carisma do falecido (...) porque o professor Lejeune sempre soube usar o seu profundo conhecimento da vida e de seus segredos para o bem verdadeiro do homem e de sua humanidade”. Graças a sua paixão e ao seu trabalho de médico e pesquisador, descobriu a origem genética da síndrome de Down, à qual deu o nome de trissomia 21 (o cromossoma excedente). Como recordou o Papa, seu grande amigo e defensor nos momentos de solidão: “A sua luta foi sempre em nome da vida, não da morte, como, ao contrário, a sua descoberta é hoje ameaçada“.
Um grande cientista, se dizia, mas também um grande homem para quem ciência e fé não estavam separadas. Por isso, podemos imaginar como foi um “sinal de contradição” e sofreu o ostracismo científico. Não apenas isso. Não se preocupou muito porém sua carreira ficou comprometida custando-lhe o prêmio Nobel de Medicina pelo que assumiu plena responsabilidade. Porém, que Jérôme Lejeune seja um sinal de vida, se viu novamente nesta quarta-feira, 11 de abril. Dentro da Catedral de Notre Dame como em seguida na recepção no Collège des Bernardins, podia-se ver um “momento do povo”. E isto tem valor dobrado na França laica.
Foi comovente e surpreendente ver tantas pessoas tão diferentes entre si envolvidas neste acontecimento, num fato presente, não apenas numa recordação comemorativa. Pessoas totalmente diferentes, com deficiências visíveis ou não, mas todas iguais porque filhas do mesmo Criador. Isto se viu durante a missa, lotada de pessoas, muitos dos quais Down, próximos ao altar, uma cena que evoca a imagem que Mounier usava para descrever sua filha Françoise: “Uma pequena hóstia branca que nos supera, uma imensidade de mistério e de amor que nos cegaria se o víssemos face a face”; tanto pessoas contratadas como pessoas deficientes serviam comes e bebes na recepção dos Bernardins. Vidas salvas pela tenacidade e pela fé de Lejeune e agora através de sua Fundação.
A senhora Lejeune, com sua coragem mais que octogenária, repetia a nós todos de CL: “A fundação Lejeune e CL são uma coisa só!” E, depois, inesperadamente, um número indescritível de amigos do CLU (universitários de CL), vindos de Milão, Bolonha, Varese e sabe-se lá de onde. Será o fator Paris ou os voos “low cost”, mas o que poderia levar estes futuros médicos a mover-se e ir até Paris para uma missa? Alguns anos atrás, dom Giussani usou uma frase que me impressionou mas nunca assim, tão profundamente. Dizia no cartaz de 1992: “Porque em toda companhia vocacional há sempre pessoas, ou momentos de pessoas, para ser olhados”. O fechamento do processo de Lejeune foi um desses “momentos de pessoas”. Reconhece um fato e nasce uma ternura por você mesmo porque está “reconhecendo e amando um outro”. É comovente quando Deus nos chama para Si, nos quer para Si, misteriosamente, de maneira que nosso “sim” se torna história.