Só com a ascese o encontro se torna mentalidade
“Testemunhamos a Sua vitória sem complexos de inferioridade e sem a ânsia de hegemonia”. O texto da intervenção que o arcebispo de Tarento fez sábado passado, 13 de outubro, na sala do SínodoBeatíssimo Padre, veneráveis coirmãos, irmãos e irmãs, o documento pontifício Motu Proprio Porta Fidei afirma que é necessário mostrar, em primeiro lugar aos cristãos e aos não cristãos, Cristo como realização de todos os desejos e de todas as expectativas do coração do homem (n.13). O cristianismo volta-se para essa exigência profunda de verdade que constitui o coração do homem, que é desejo de Deus (cf. Ibid. , n. 10). E a Igreja tem a dizer a todos os homens uma palavra definitiva sobre a vida e sobre a morte, sobre o significado do mundo e da história.
O anúncio cristão do Verbo feito carne, morto e ressuscitado, realiza o que na consciência do homem emerge, às vezes, como pressentimento ou profecia. Cristo ressuscitado proclama que tudo na história é remissível, que não se perde nada no vórtice dos eventos, que se pode viver, por isso, sem esquecer nem renegar nada. A Nova Evangelização tem sede de encontrar os cristãos hoje distantes e de dialogar com a cultura atual do mundo. Mas o mundo, muitas vezes, não tem nenhuma vontade de dialogar conosco, e se o faz é apenas em batalhas por ele fixadas segundo o espírito do tempo.
Mas também nos inícios da Evangelização ninguém tinha interesse em dialogar com os cristãos, com aquela pequena fileira de homens estranhos que acreditavam que um homem crucificado tinha ressuscitado. Mas era justamente a esse mundo que eles se dirigiam, mostrando a quem os ignorava ou os perseguia a experiência de uma vida transformada e a proposta da salvação. A resposta a esse mundo não se dava com um discurso, mas com o milagre de uma humanidade transformada. E mesmo quem propunha um discurso, como o filósofo Justino, dava ao mesmo tempo a prova suprema do sangue: o martírio.
Homens e mulheres, escravos e senhores, ricos e pobres eram encontrados por Cristo por meio do sinal da Igreja, da unidade que os alcançava, por meio de um amigo, por meio da mulher amada, do soldado, do centurião, do escravo, da mulher convertida, da virgem, da mãe de família.
Para os cristãos distantes e para as pessoas que não se põem o problema da fé e que seguem o seu caminho pleno de sofreguidão e de incertezas, o que impressiona é apenas o encontro com um milagre que, na força do Espírito, toca o coração, isto é, o afeto e a razão. Para que a verdade intuída no encontro cristão se torne mentalidade pessoal requer-se, por isso, um trabalho, ascese contínua, que é pessoal e que só cresce dentro da Igreja, como corpo social que incide sobre a vida da sociedade. A presença evangelizadora no mundo só é possível pela força do Espírito e pela ligação com uma unidade maior.
Depois de 27 anos de missão e de serviço à Igreja no Brasil, voltei para a Itália, para uma diocese de antiga evangelização, num contexto de difusa e sentida religiosidade popular, onde a fé é fortemente provocada pela secularização. Pelos efeitos poluidores da maior fábrica siderúrgica da Europa, doze mil pessoas (vinte mil ao todo) correm o risco de perder o emprego, enquanto muitas outras pessoas já foram vitimadas por tumores e outras graves doenças, por causa da contaminação ambiental.
A Igreja não ficou indiferente, mas logo tomou o partido da defesa da vida, atacada pela dioxina e por outras substâncias tóxicas, mas também defendeu o emprego, que permite o desenvolvimento da vida. Não dispondo de uma receita para a solução desse grave problema, oferecemos uma presença solidária e um apoio concreto aos que foram afetados pelos efeitos desastrosos dessa triste alternativa, neste período de recessão econômica mundial. Não oferecemos soluções, mas proximidade, conscientes da missão de nos fazer peregrinos junto àqueles que sofrem, favorecendo o diálogo e a negociação e o bem comum. Por isso, visitei os operários do alto-forno 5, que estavam em greve a sessenta metros do solo e me encontrei com os doentes de câncer, visitei a liga contra a leucemia, a esclerose múltipla, a associação nacional de câncer e outras associações, entre as quais a que combate a poluição. Mas o conflito permanece aberto e podemos ver a profunda crise humana e social desse modelo de desenvolvimento econômico.
Jesus abraçou a necessidade, colocou-se do lado dos pobres, dos pequenos, dos pecadores, dos excluídos. Amou-os e nesse gesto revelou o rosto do Pai. “Como eu vos amei, amai-vos também uns aos outros. Nisto reconhecerão todos que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns pelos outros” (Jo 13,35). É indispensável que o anúncio vibrante da fé esteja unido ao testemunho da caridade. No Motu Proprio Porta Fidei está escrito, a esse propósito: “A fé sem a caridade não dá fruto e a caridade sem a fé seria um sentimento assaltado constantemente pela dúvida. Fé e caridade se exigem mutuamente, de modo que uma permite que a outra complete a sua caminhada” (Porta Fidei, n.14).
E o senhor, Beatíssimo pai, nos disse segunda-feira, dia 7 de outubro, que a confessio, a confissão da fé, deve estar unida à caritas, ao ardor, ao fogo da caridade. Assim a Igreja poderá colocar dentro da necessidade humana o milagre da cura que Cristo opera por meio do anúncio e do testemunho da caridade cristã. E isso, tanto no desafio das pobrezas, velhas e novas, quanto no drama da saúde ameaçada pela poluição e pelas fábricas que ameaçam fechar. Nas alegrias e no drama da vida anunciamos a presença de Cristo Ressuscitado, a Sua vitória sobre o mal e sobre a morte sem complexos de inferioridade e sem a ânsia de hegemonia.