Amazônia 2/4. O barro e algo que Nietzsche não poderia imaginar
Guillermina mora em Ocotlán, México. É uma artesã com dez filhos. «O barro é terra, água, fogo e ar, mas sem mim não é nada. Quando tenho a massa, rezo e não uso moldes». Assim ensina seu trabalho... e a responsabilidadeNietzsche, no final de sua vida e já muito doente, sonhava em ir morar em Oaxaca para recuperar a saúde, pois lhe tinham mostrado umas fotos dessa região do México e ficara encantado.
Num dia de chuva tropical, um grupo de mulheres com vestidos multicoloridos caminhava pela rua sem se proteger da água, porque – como disse Guillermina –, «temos que deixar que as coisas nos afetem: pisar na terra, passar fome, molhar-se com a chuva, chorar com a dor, falar com os amigos...». E em seguida: «Minha mãe me ensinou a nunca secar a minha mão».
Estas foram palavras que escutei pela primeira vez da boca de Guillermina, uma oleira zapoteca que vive em Ocotlás de Morelos, no estado de Oaxaca, México; é mãe de dez filhos que, como ela, trabalham na agricultura e amassam o barro. Para essa mulher, a realidade é sagrada quase de um jeito natural. E quando fala de qualquer coisa, o faz com propriedade e sabedoria, sem ter tido formação universitária. Uma relação religiosa com tudo define sua consciência.
Vê-la trabalhar em seu forno artesanal simples convida a perguntar sobre seu ofício. Um dia, dividindo um café, perguntei-lhe o que era o barro. Não hesitou nem um momento e respondeu: «O barro é terra, água, fogo e ar, mas sem mim não é nada. Quando tenho a massa do barro, rezo e não uso moldes. Cada figura é sempre nova». Uma mulher criar dez filhos e trabalhar com alegria e criatividade não é comum. No entanto, para ela não é um problema trabalhar e ser mãe, e costuma dizer: «Eu carreguei meus filhos nas costas até os cinco anos de idade, enquanto batia o barro ou cuidava da terra. Mesmo não sendo fácil criar os filhos». Diferentemente do que muitos de seu povo pensam, ela tem certeza de que «o trabalho é energia para a vida e também é uma bênção para a pessoa».
Sem dúvida, o céu intensamente azul de Oaxaca estimula seus artistas e artesãos a realizar obras de grande beleza, mas há mais do que isso: por trás de pessoas como Guillermina, existe a história de um povo religioso que educa na responsabilidade desde a infância. Tudo isso está longe da imagem de indolência que se tem de certas etnias indígenas.
Guillermina conta que aprendeu o que é a responsabilidade aos dez anos, «quando minha mãe me mandava levar a café a meu pai, que trabalhava no campo desde as cinco da manhã para nos manter».
O que Nietzsche não poderia imaginar é que nessa bela terra encontraria interlocutores sábios como Guillermina, com quem poderia aprender muito.
(Continua)#SínododaAmazônia