Chávez está morto, não cometamos erros

Manutenção do mito chavista vai depender de uma série de variáveis, segundo o analista
Carlos Malamud

As notícias e rumores sobre a saúde de Hugo Chávez aumentou dramaticamente nos últimos dias. Quase todos concordavam com um agravamento do estado presidente venezuelano afligido pelas consequências de um terrível câncer contra o qual vinha lutando há dois anos.. Finalmente tornou-se titular de sua morte sobre a qual muito tem se especulado ultimamente, favorecido pela opacidade da política de comunicação do governo venezuelano.

O objetivo deste artigo é refletir sobre o futuro que já começou a ser escrito na Venezuela e em outros países da América Latina. Em torno deste futuro existem muitas perguntas a começar se haverá chavismo sem Chávez, e a manutenção da influência da chamada revolução bolivariana em parte do continente. Em linha com as duas questões anteriores estamos ante o nascimento de um novo político na região, comparável ao mito bolivariano, ou ao contrário, depois de um tempo razoável começará a eclipsar-se a figura daquele que foi uma das principais referências do populismo anti-imperialista latinoamericano?

A nova situação criada com a morte de Hugo Chávez mostra a oposição venezuelana em má forma. Depois de desperdiçar os bons resultados da eleição presidencial anterior não encontrou uma forma de enfrentar o oficialismo que tem boas chances de impor seu candidato nos próximos comícios. A realidade econômica põe em risco o futuro de Chávez na Venezuela, responsabilizado pelos efeitos de uma desvalorização desastrada da moeda, até agora bastante atenuada.

A grande maioria do povo venezuelano, o mesmo que foi resgatado do esquecimento e exclusão social, sempre perdoou Chávez de seus erros. Tudo é visto com bastante tolerância: o mau estado da segurança pública e altos índices de criminalidade, problemas de escassez de alimentos e bens, a inflação alta ou outros problemas igualmente graves. No entanto essa paciência pode não beneficiar seus sucessores. O carisma e grande habilidade política Chávez é único e intransferível. Portanto, o futuro do chavismo vai depender do trabalho de quem assumir o Palácio de Miraflores e a capacidade da oposição para evitar erros que podem permitir a vitimização do projeto bolivariano.

O que acontece fora das fronteiras da Venezuela será uma outra história. Em primeiro lugar o interesse estratégico de Cuba na evolução do processo bolivariano e sua dependência na área de energia. Em segundo lugar o que acontecerá com a ALBA sem a forte liderança que Chávez. Enquanto Rafael Correa, Evo Morales e Cristina Kirschner tentão manter viva a aliança pode ser o fim da estreita relação com Fidel Castro mantida pelo constante fluxo de petrodólares venezuelanos, vital para a expansão do bolivarianismo em toda a região.

Chávez foi único no desenvolvimento de uma narrativa nacionalista e anti-imperialista e não se sabe se seus sucessores serão capazes de mante-lo. O que se tem visto até aqui mostra alguns limites. Apesar de os centros nervosos de Cuba e Venezuela trabalharem na construção de um novo mito político comparável a Simon Bolívar e Che Guevara como responsável pela revolução continental, não se dará em apresentar Chávez assassinado pelo imperialismo como deu a entender alguns movimentos nessa direção.

O discurso dominante até aqui é apresentar o comandante bolivariano lutando contra um câncer persistente, apesar da ausência de provas de sua natureza exata. Isso não se coaduna com a ideia de uma conspiração que terminou em assassinato. Obviamente, no curto prazo, Chávez tem todas as cartas a seu favor para que sua memória prevaleça na Venezuela, mas esse poder vai depender muito mais de seus próprios sucessos do que dos erros dos outros. Disso Hugo Chávez se beneficiou um dia, mas aquele momento histórico já passou.

(Infolatam - Paginas Digital)