Passos N.135, Março 2012

Um momento no tempo

As apresentações do novo texto de trabalho do Movimento, Na origem da pretensão cristã, de Dom Giussani, tiveram início no dia 25 de janeiro, em Milão. Estavam presentes duas mil pessoas no teatro, quase todas com menos de 25 anos. Outras 50 mil assistiram conectadas por videoconferência no resto da Itália e em alguns pontos do mundo. E foram noventa minutos tensos, densos, desde o Et incarnatus est, de Mozart, cantado ao vivo por uma soprano famosa, até o Angelus final. Poderíamos definir o que aconteceu como um “evento”, se não fosse abusar da palavra. Algo grande. À primeira vista, muito grande para ser explicado apenas com o motivo daquele encontro: reapresentar um livro publicado há vários anos e já lido e relido por muitos dos presentes. Onde estava a novidade? E para ser mais preciso, onde está a novidade no conteúdo deste livro que, no fundo, fala de Cristo e do Evangelho? Dois mil anos depois, o que o cristianismo ainda pode pretender do homem?

O texto daquele encontro, repetido no Brasil no dia 12 de fevereiro com a presença de padre Julián Carrón, está na Página Um desta edição de Passos. Basta lê-lo com atenção para ver a novidade vir à tona. Assim como aconteceu naquela sala e onde existe um coração propenso ao pedido. Porque a novidade acontece ali, naquele coração. No homem que encontra Cristo. É ali que tudo é decidido. Naquele “florescer do humano” que acontece imprevisivelmente quando a fé se torna uma experiência real. E o humano não é abstrato: sou eu, é você. Agora. Não há nada mais novo do que isso. Nada mais “subversivo e surpreendente”. A novidade, de fato, é que “Cristo é algo que me acontece agora”. Este é o conteúdo do anúncio. E esta é a grande pretensão que cada um pode verificar na sua vida. E é somente por isso que é possível responder “sim” à grande, inquietante e atualíssima pergunta colocada por Dostoiévski em Os Demônios: “Um homem culto dos nossos dias, pode acreditar, crer de verdade, na divindade do filho de Deus, Jesus Cristo?”.

Um Fato. Se O seguirmos, Ele se revelará a nós mesmos. Se O deixarmos de lado, ficaremos estranhamente enfraquecidos no enfrentamento da realidade. Na vida de todos os dias, como mostram as muitas histórias pessoais que publicamos nos últimos meses sobre a crise. Ou no enfrentamento dos grandes problemas, nos assim chamados “cenários”.
Não conseguimos entender a beleza e a densidade humana de nossa cultura e de nossa sociedade se eliminarmos, mais ou menos conscientemente, a raiz do seu modo de viver, de pensar, de usar a razão e conceber a realidade, o humano, os direitos, a economia. E essa raiz, admitam ou não, é aquele Fato. Se o censurarmos, antes ou depois a conta será cobrada. Atenção: a questão não é apenas que se passa por cima de certos valores. O problema de fundo é a razão usada de forma restrita, como o Papa sempre diz. Tudo se complica. Temos dificuldades para encontrar motivos, que não sejam circunstanciais, para estarmos juntos. Temos dificuldade para ver uma perspectiva, pra buscar o bem comum. É um salto indevido? Pensemos nas nossas dificuldades tendo em mente a seguinte pergunta: é possível desenvolver um país, criar riquezas, construir uma sociedade melhor, sem buscar um bem comum? Sem que se reacenda o desejo no coração do homem? Ou bastam ajustes fiscais, procedimentos jurídicos e políticas assistencialistas? E o que reacende o coração como nada mais?
Um Fato. “Um momento no tempo e do tempo”, escreveu T. S. Eliot, citado por Giussani: “O tempo foi feito através desse momento, pois sem significado não há tempo, e aquele momento do tempo lhe deu o sentido”. E dá ainda hoje. Esta é a novidade