Passos N. 250, Setembro 2022

Interesse puro

Neste mês reservamos a primeira parte da edição para falar do Meeting de Rímini, o grande evento cultural que aconteceu na Itália no final de agosto, durante o verão europeu. Realizado em pavilhões, como as grandes bienais do livro, nasceu há mais de 40 anos da iniciativa de membros do Movimento Comunhão e Libertação, sendo muito frequentado pelas comunidades de CL do mundo inteiro. Este ano, mais uma vez envolveu a todos numa beleza imponente, feita de milhares de detalhes minuciosos, como as linhas desenhadas à mão pelos voluntários na capa. Passam a impressão de que não foram pintadas uma a uma, e de que quem pintou não era tão jovem. Adolescentes e adultos usam as férias para construir os espaços da semana, revezando-se com outros voluntários, de todas as idades e origens.

O Meeting comunica uma coisa simples e rara: no meio do desinteresse geral, há alguém que tem paixão por si mesmo e pelos demais. É extremamente significativo ouvir Al-Issa, uma das autoridades máximas do islamismo, falando no palco de Rímini que, para ele, a “sabedoria” e a contribuição de Dom Giussani é ter entendido que “a maioria privação, no contexto atual, é a perda do sentido daquilo que é humano”. Estas palavras ecoam aquilo que, para o fundador de CL – numa fala do Meeting de 1985, da qual foi tirado o título deste ano –, era o maior perigo para a humanidade: “A perda do gosto de viver”. O Meeting, ao falar de tudo, dialoga com este problema e é plasmado pelo fato de ser possível encontrar a paixão pelo homem e o seu destino.

Então “o essencial é saber ver”. Essas palavras se destacavam dentre os versos vertiginosos de Fernando Pessoa, protagonista de uma das exposições, autor que fragmentava e multiplicava seu “eu” em outros “eus”; mas não bastava, ansiava por um amigo que o compreendesse e continuava buscando: “Tudo tive na mão na busca ansiosa que enche minhas noites e dias. Mas nunca o meu coração”. Ele tinha tamanha percepção do seu humano, que dizia que “tudo é pouco para o que eu quero” e, ao mesmo tempo, que “tudo vale a pena se a alma não é pequena”. Os sinais deste humano infinito e sedento estavam por toda a parte na feira: nas histórias silenciosas e nas histórias gritantes, na vida que resistia nos gulags ou no estudo das galáxias, da caridade cotidiana à arte, da justiça à música.

No Meeting não havia uma solução para as catástrofes do mundo, mas o interesse pela pessoa que está por trás de uma máquina fotográfica, por trás de qualquer obra ou trabalho: sem sujeito, não existiria nada, e é a única construção que vale. Os convidados no palco ou quem explicava as exposições, as personalidades de alto nível e os voluntários, todos maravilhados por uma única percepção: a atenção das pessoas que tinham à sua frente. Um interesse puro, pela vida própria e pela do outro.
É forte a gratuidade de um olhar. Não parece nada, mas desperta a consciência. Naquela fala de 1985, Giussani pensava em como nasceu, historicamente, o interesse por Cristo: com uma pergunta. “Por que é que esse aí diz essas coisas?”. E com uma resposta que florescia no coração, quase sem que as pessoas estivessem cientes disso: “Porque ele ama o homem, porque tem paixão pelo homem!”.