Passos N.39, Maio 2003

A “arma” para a reconstrução do humano

“Não estou interessado só na educação, mas também, e em especial, nas propostas inovadoras do padre Giussani para recuperar a educação como atividade cristã. Teria muito o que dizer sobre o seu livro Educar é um risco. Mas me encontro em tal sintonia com Giussani que tenho de me render a admitir: gostaria de tê-lo dito eu próprio”. Palavras de Stanley Hauerwas, que em 2001 foi classificado como “o melhor teólogo dos Estados Unidos” pela Time Magazine. Ele participou, junto com outros cinqüenta professores universitários, filósofos e pedagogos, no final de abril, de um congresso na Georgetown University, de Washington DC. O tema era The Risk of Education (Educar é um risco), o texto do padre Giussani há pouco publicado nos EUA. Esse é um pequeno mas significativo evento, que se desenvolveu a poucos metros dos palácios em que, nos mesmos dias, se decidia o rumo da reorganização política do mundo. Uma coincidência que ajuda, mais do que muitos discursos, a perceber o que é importante em meio à confusão deste período.
Há cerca de trinta anos, o poeta Pier Paolo Pasolini se interessou pelos jovens que, nos anos 70, marchavam pelas ruas com hinos e slogans e que queriam mudar o mundo. Percebia, naquele ímpeto, uma fraqueza: os jovens confiavam nos bons sentimentos e exaltavam a organização para resolver os problemas. Mas aquela “geração desafortunada” – dizia o poeta – não encontrara tempo para comover-se frente aos sacrários dos antigos ou à tela de um pintor do século XVI. E, tendo rejeitado a tradição, essa juventude encontrava-se desprovida de raízes para enfrentar o presente.

Hoje, nestes tempos confusos marcados pela violência, pelo terror e pela guerra, muitos apelam de novo para os bons sentimentos e exaltam a força das organizações. Assim, parece que todo o campo da ação humana está ocupado por apenas duas possibilidades: os sentimentais slogans a favor da paz e da tolerância, ou a estratégia refinada e poderosa das nações. Em ambos os casos, em última análise, a construção de um futuro melhor é entregue ao funcionamento de boas organizações. Mas se sabe que nenhuma boa organização (nem familiar, nem mundial) garante, por si só, a paz e a liberdade. Precisamos de algo mais.
Quase ninguém parece considerar que este tempo de tensões e de dramas força o homem a questionar-se sobre quais são os seus reais recursos para enfrentar a questão. Por isso, enquanto todos parecem agarrar-se às posições que consideram justas, e assim são geradas em todos os níveis – pessoal, nacional e internacional – as condições de maior divisão e desencontro, alguém “pega o touro à unha” e pergunta: como estamos educando as nossas vidas e os nossos filhos? Como reforçamos nos jovens e em nós mesmos as razões que fazem um homem livre, isto é, alguém capaz de buscar o que é verdadeiro, bom e justo, que seja capaz de esperar, em meio a tantas contradições? Como surge, na história, um homem verdadeiramente livre? Os cinqüenta participantes do congresso realizado em Washington fizeram essas perguntas durante dois dias, com uma seriedade ainda mais exemplar, porque é difícil de ser encontrada hoje. Nos diálogos dos professores Schindler, Hauerwas, Tillman e outros, não havia nada de abstrato e artificial. Toda a experiência humana e intelectual deles entrou no jogo, pois o problema educacional era percebido como a prioridade número um dos Estados Unidos (e também do resto do mundo), exatamente nestes dias marcados pela guerra.

Ainda uma vez, em meio à cena convulsionada da história contemporânea, enquanto ideologias de todo tipo se confrontam, os cristãos apresentam o seu anúncio de boa-nova para a vida real das pessoas, fixando pontos de recomeço e de esperança. E oferecem a experiência de uma educação vista como “arma” para a reconstrução do humano, para apoiar “a grandeza e a profundidade da luta entre os homens”. Como aconteceu em Rímini (Itália), na vigília da Páscoa, quando o padre Giussani falou para sete mil estudantes secundaristas: “O homem busca a felicidade, diz a Bíblia. Qual é o método? Desde que o Senhor nos tocou e nos empurrou para frente, desde esse momento não há mais nada que possa substituir o dom de Deus na vida”.
Educação é liberdade.