Passos N.45, Novembro 2003

Encontro com o nada ou com o Ser

Há uma nova moda que se difunde pelo mundo, de Nova York a Paris passando por Roma e Milão. Chama-se Flash mob - literalmente, “movimento instantâneo”. Poderia ser chamada também de “encontro com o nada”: um anônimo marca um encontro via internet, a certa hora, num determinado lugar, sem motivo algum, só para fazer ali uma manifestação vazia: um aplauso, um grito... Poucos minutos de aglomeração e pronto, a casual e desconhecida multidão se dispersa. Depois, sempre no anonimato da rede, marca-se novo encontro.
Os participantes se dizem satisfeitos com essa “ligação frágil”. Provavelmente, por trás da palavra “frágil” exista o desejo de que a experiência de uma ligação seja também uma experiência de liberdade, sem as amarras de um compromisso ou de um projeto.
Qualquer moda, mesmo a mais excêntrica, nasce de um desejo, que talvez se desvia ou se acomoda numa diversão, bastando que gere satisfação.

A vida, toda vida, espera um encontro. Uma existência pobre de encontros não interessa a ninguém. Mas se falta o encontro com o significado da vida, mesmo que se preencha a jornada com muitas atividades, o que resulta daí só pode ser perturbação e tédio.
O cristianismo, no fundo, é exatamente o encontro com o significado. O evento cristão foi o mais inesperado e definitivo encontro que Deus marcou com o homem: era o fim da busca às apalpadelas, nos sinais do fogo, do céu e nas profecias. É o encontro com uma presença humana, com um homem que bebe e come, que se comove e que busca a amizade dos homens. Deus marcou o encontro no lugar mais próximo e acessível: a cotidianidade de uma companhia, o que suscitou o escândalo dos que queriam manter Deus distante da própria imaginação, como coroamento da própria inteligência.

“Um dia, entrou em casa o Estrangeiro” , escreveu um grande poeta italiano, Piero Bigongiari. Desde que o Estrangeiro (ou, como Eliot chamava a Igreja, “a Estrangeira”) entrou no horizonte da História, abriu-se para o homem a possibilidade de encontrar-se com o significado do mundo. É uma experiência que realiza, de maneira única, a ligação como experiência de liberdade. Não só liberdade de qualquer laço que prenda o homem segundo alguns dos seus aspectos (político, tribal, instintivo ou social), mas sobretudo liberdade como descoberta contínua do valor infinito do eu.