Passos N.86, Setembro 2007

Pela construção do bem comum

“O sono da razão cria monstros”, escreveu o pintor espanhol Francisco Goya em uma de suas gravuras. Quando olhamos a situação brasileira atual muitas vezes temos a impressão que a razão – o “bom senso” – está adormecida no país. É como se os interesses pessoais, o ganho e o lucro, a ganância política e econômica, falassem mais alto do que qualquer lógica de construção da sociedade e do bem-comum.

Na queda do avião da TAM em Congonhas, multiplicam-se as ocasiões de erro e os descasos. Fica evidente que critérios de maximização do lucro, de utilização política das obras e a falta de planejamento estratégico são as causas últimas do acidente. E parece que a busca de solução continua a ser determinada por esses mesmos critérios. Mas, como alguns notaram, o “apagão” do setor aéreo é apenas aquele que mais aparece no momento atual. Porque há muito tempo já existe o “apagão” da segurança, o da educação, o da energia, o do atendimento aos pobres e aos idosos, etc.

Defende-se que para diminuir a criminalidade, deve-se aumentar o número de abortos! Na prática a frase significa: se os filhos não têm educação e as mães sofrem com a insegurança em que vivem, matemos esses filhos desde logo. Se o sexo se tornou generalizado entre os jovens e perigosos, distribua-se preservativos, e deixemos os jovens sem saber como amar.

A cada dia, temos mais escândalos de corrupção, e o acusador de ontem se torna o acusado de hoje.

Não deixa de ser irônico constatar que o jornal “A Província de São Paulo” já escrevia, em 1875, “governo, partidos e a mesma sociedade, no quanto pode ser essa compreendida, vacilam, agitam-se no vácuo quando não dormem no sono da atonia, o que tudo revela ausência de convicções, de observação, de tirocínio, experiência e estudo de princípios”.

O grande drama é que não existe razão, não existe “bom senso”, se a pessoa não é colocada em primeiro lugar, porque ela é o ideal maior de uma sociedade. Não nos colocamos juntos, não vivemos em sociedade, pelo bem de entidades abstratas chamadas Estado ou mercado, mas para que a nossa dignidade de pessoa, o nosso desejo de realização e de bem se concretize. Esse é o único ideal capaz de vencer a ânsia pelo lucro, o despotismo do poder e a política vivida com vistas aos próprios interesses pessoais. Ele permite uma verdadeira racionalidade na política, que não é só estratégia de luta pelo poder, mas construção do bem comum.

Nesse contexto, qual é nossa tarefa? Testemunhar Cristo, testemunhá-lo com todos os instrumentos de nossa vida. Só o homem que se sente amado e acolhido, é capaz de olhar a realidade com positividade, encontrando nela as veredas que levam à construção do bem comum. Essa é a experiência que fazem todos aqueles que encontram a Cristo e percebem que “Deus é amor”.

Por isso a presença da Igreja é a resposta mais adequada e razoável para responder a essa situação, ela é um corpo social que coloca na sociedade um dinamismo construtivo, capaz de se opor ao desnorteamento generalizado e a falta de ideal que atinge nossa sociedade.